segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Depois de três anos de crise, de volta à situação de 2008.

Ao final de 2010 pelo quinto ano seguido o pico de produção de petróleo cru, convencional, alcançado em 2005, no entorno dos 73 milhões de barris diários, deixou novamente de ser atingido.

Isso seria  impossível de acontecer em condições normais, já que os produtores privados ou estatais de petróleo tiveram sempre total liberdade para vender seu produto a preços que tem se mantido a enormes alturas, desde 2004, e o mais inescapável resultado da lei da Oferta e Procura é que num mercado de preços crescentes os vendedores só não aumentarão a produção para ampliar sua fatia do mercado, tirando proveito da situação favorável, se não tiverem condições de fazê-lo.

O fato concreto é que a OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), que atualmente responde por 42% do suprimento global, há cinco anos tem mantido a produção estável, no entorno dos 30-31 milhões de barris por dia, enquanto que o resto do mundo tem oscilado a duras penas no entorno dos 58% restantes, lutando contra o declínio dos velhos poços, compensado com grande dificuldade pelas novas perfurações.

O método com que tem sido escondido esse muitíssimo grave problema de estabilização da produção, num platô ondulado que indica a iminência da queda, tem sido introduzir na contabilidade da produção a totalidade “dos líquidos combustíveis”, computando os líquidos do gás natural (LGN), os ganhos de refinaria e os “outros líquidos” (inclusive etanol, bio-diesel e combustíveis sintéticos), o que resulta numa produção que se mostra crescente ao longo dos anos, e que hoje soma cerca de 10 milhões de barris aos 73 milhões de barris de óleo cru, fechando a conta dos pouco mais de 83 milhões de barris que constituem a presente demanda mundial.

Mas isso é uma técnica de desinformação conhecida, onde o fato fundamental é disfarçado numa barragem maior de dados e informações.

Com esse artifício fica escondida a verdade de que LGN, ganhos de refinaria, bio-combustíveis e combustíveis sintéticos não são o mesmo que óleo cru, contendo menos que 70% da energia do mesmo volume de óleo, além do que, não se constituem por si mesmos numa fonte original de energia porque eles mesmo são o resultado de um processo complexo de conversão de energia provinda de outras fontes que não o óleo crú...

Assim, o mundo não está produzindo os 83 ou 84 milhões de barris de óleo necessários para equilibrar seu balanço energético, mas vem oscilando no entorno dos 73 milhões de barris de óleo cru que somados aos menos de 10 milhões de barris equivalentes oriundos dos “outros líquidos”, já estão se tornando insuficientes para atender à demanda, a despeito da crise econômica.

Isso nos traz de volta à situação detonadora da crise de 2008, quando a inexistência de folga entre produção e demanda levou o preço acima dos 100 dólares o barril, refletido nos aumentos de preços que causaram o estouro das bolhas econômico-financeiras do primeiro mundo e distúrbios populares nos subdesenvolvidos.

Pois 2011 mal começou, e já podem ser vistos importantes choques de preços e crises de alimentos em varias partes do globo. Os distúrbios populares de fundo econômico que já ocorreram na Argélia, Tunísia, Moçambique, Bangladesh, Indonésia e agora no Egito, derivam da íntima conexão entre hidrocarbonetos escassos e a produção de alimentos, que pode ser claramente verificada no gráfico abaixo. (Clique na imagem para ampliar)


O índice mundial de preços de alimentos, da FAO (Food and Agriculture Organization, da ONU), calculado em dezembro de 2010 já ultrapassou ligeiramente o pico alcançado em junho de 2008, refletindo os aumentos mundiais de todas as comodities alimentícias.

Quando se fala em escassez de petróleo dificilmente alguém se refere ao mais devastador dos problemas que é a repercussão sobre a produção de alimentos.

A simples inspeção do quadro acima mostra que essa é a QUESTÃO FUNDAMENTAL (Cap.7, pag 67, O Crepúsculo do Petróleo: "É a Comida, Estúpido !"), pairando muito acima da convergência de crises causadas pela muito próxima e inelutável queda na produção mundial de petróleo.

2 comentários:

  1. Ótimo artigo, Mauro. Esta correlação entre redução na produção de petróleo e aumento nos preços de alimentos não é usualmente explicitada.Se o problema não fosse bastante, está em marcha também a crise de recursos hídricos com escassez crescente e qualidade decrescente.

    ResponderExcluir
  2. É verdade, a crise de recursos hídricos vai ser coisa braba, principalmente onde a situação já é crítica por outras razões, como no Oriente Médio.

    Vai correr muito sangue por causa de coisas "simples", como barragens à montante de rios. Felizmente, mais uma vez, o Brasil é privilegiado: além dos rios gigantescos na superfície, tem o enorme reservatório subterraneo de água doce, cristalina, abrangendo todo o Sul do país, que é o "aquifero Guarani".

    ResponderExcluir