segunda-feira, 6 de julho de 2009

Desculpem, mas o cenário é pior ainda !!

Começa a penetrar na consciência de mais e mais pessoas que o detonador da crise econômica foi o crescimento exponencial do preço do petróleo até o pico de US$ 147 ocorrido em julho de 2008, e de que esse condicionante devastador tende a se apresentar de volta com plena força -- o que já começa a ocorrer com os preços atingindo de novo o patamar dos US$ 70.

A projeção de um declínio líquido de produção no entorno dos 3% ao mês, mostrado nos gráficos postados em 24 de junho, foi feito com base na experiência das dezenas de províncias petrolíferas que atingiram o pico e entraram em declínio irreversível, como os próprios Estados Unidos (que fez pico em 1970), o Mar do Norte (que atingiu o pico em 2000), e a Rússia (em 2007) -- dentre as mais importantes.

Nesses gráficos é pressuposto um cenário em que a produção depois de atingir o pico vai decaindo suavemente por várias décadas, de modo que lá por 2050, ou coisa semelhante, o mundo será forçado a viver com menos da metade do óleo que é atualmente consumido.

É fundamental que se perceba que mesmo a expectativa desse declínio suave é suficiente para determinar uma situação caótica de empobrecimento e confrontação entre paises e blocos de países, crescentemente asfixiados por uma crise econômica de solução impossível devido à escassez de energia -- a única fonte de capital concretamente lastrado em produção material.

Mas quando os especialistas extrapolam o declínio de produção baseando seus cálculos no que ocorreu nas províncias produtoras que ultrapassaram o pico, deixam de considerar o fato fundamental de que essa queda de produção, sendo apenas local, teve mínima repercussão econômica porque o déficit energético sempre pôde ser compensado pela importação do petróleo, como ocorreu nos Estados Unidos a partir de 1970.

Desse modo, as taxas médias de declínio líquido da ordem de 2%, 3% ao ano, refletem uma situação em que as empresas produtoras de petróleo tiveram todas as facilidades para investir e introduzir as inovações tecnológicas necessárias a maximizar a produção -- em total oposição ao que ocorre numa situação de crise global e de competição por recursos escassos realimentada, em circulo vicioso, pelo próprio declínio da produção mundial.

A retro-alimentação da crescente crise energética determina por si mesma incontornáveis obstáculos à arregimentação dos recursos materiais e humanos que seriam necessários para sustar ou minimizar o declínio, o que já está ocorrendo com a desistência ou adiamento de inúmeros mega-projetos de expansão que deveriam entrar em operação na faixa 2008/2012.

A medida em que as perdas começam a se acumular, ano após ano, a escala do déficit energético é estarrecedora: cada milhão de barris produzido a menos por dia (365 milhões de barris por ano) teria que ser substituído por 58 usinas nucleares do padrão de Angra I.

O declínio anual liquido de 3% sobre a presente produção de 83,5 milhões de barris diários corresponde a 912 milhões de barris a menos por ano, que teriam que ser substituídos por 145 usinas nucleares; e mais 145 usinas para compensar a perda do ano seguinte; e mais 145 para compensar a perda do seguinte; e mais 145...

Note-se que estamos tratando de um problema que vai começar a ficar indisfarçável já em 2012, quando a demanda dificilmente será atendida mesmo  estabilizada pela crise no atual patamar dos 80/90  milhões de barris (73/75 milhões de petróleo crú + 10/12 milhões de combustiveis liquidos diversos, inclusive etanol).

E 2012 é praticamente amanhã. 2015, depois de amanhã.

Pode ocorrer que entre 2012 e 2015 a capacidade mundial de produção seja menor  que 70 milhões de barris por dia, cerca de 13 milhões de barris a menos do que os produzidos hoje -- que teriam que ser substituídos por 754 novas usinas nucleares, ou por cana plantada em 1.900.000 km2 (24% do território brasileiro).

E para compensar o déficit do ano seguinte, mais 265.000 km2 de cana, ou 145 usinas nucleares...

Dever estar ficando óbvio que por esse caminho não há solução.

O slide que já foi reproduzido numa das postagens mais antigas resume muito bem a situação:


Apesar de todas as vantagens que se oferecem ao Brasil, vão ser bem duros os anos que vem por aí. Tenho a esperança de não estar sendo inconveniente alertando a todos quanto à necessidade de fechar bem as escotilhas do nosso barco-família, e escolher a rota com cuidado para enfrentar essa tormenta, tanto a nível pessoal quanto nacional.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

A Tempestade Perfeita

Os economistas da moda, e os interesses que os alimentam, continuam a ignorar que o detonador da Depressão Econômica que se espalha pelo mundo foi o atingimento do atual patamar-limite da capacidade mundial de produção da energia barata do petróleo convencional, alcançado no período 2004/2009, no entorno dos 72/73 milhões de barris diários de petróleo crú.

Por esse motivo continuam a considerar que a crise é conseqüente da concessão irresponsável de empréstimos nos EUA - e que os pacotes de estímulo e medidas de salvação sem precedentes já mostram seus efeitos na elevação dos índices da Bolsa, ocorrido no último trimestre.

Na verdade pode-se verificar facilmente que depois de cair para menos que 46% do valor que tinha em 2007, o índice Dow Jones, à custa de muita propaganda enganosa e de investimentos bilionários, teve uma cambaleante “recuperação” para níveis próximos de 61% do valor inicial, que já volta a instabilizar-se porque a crise evoluiu tão rapidamente que tornou obvio que a tentativa de resolver o problema pela injeção de dinheiro sem lastro na economia só piora uma situação que é de “ruptura sistêmica” – uma descrição que já entrou na linguagem do próprio establishment dominante.

Desse modo, devido à ausência do enfrentamento da origem do problema, devemos nos preparar para a superposição da crise energética com a convergência de três vendavais particularmente destruidores, a “tempestade perfeita” que vai desabar sobre o mundo na segunda decada deste século:

1º) a sucessão de falências de bancos, empresas, países, regiões;
2º) o desemprego maciço;
3º) e, finalmente, a crise terminal dos Títulos do Governo Americano e do Reino Unido, projetando a quebra do Dólar e da Libra Esterlina,  com a cessação de pagamentos dos Estados Unidos  e do Reino Unido, que estão no cerne do sistema financeiro.

O que do ponto de vista energético torna essa situação cada dia mais clara é o fato de que em 2009, pela primeira vez, a EIA (Energy Information Administration - Americana) e a IEA – International Energy Agency demonstraram em seus relatórios estar se juntando aos geólogos de petróleo e outros conceituados especialistas do ramo que vem há alguns anos alertando que a produção mundial de petróleo barato, convencional, já atingiu o nível máximo sustentável e que tende a entrar em declínio, causando o caos econômico global.

A isso se soma o alerta do próprio relatório 2009 da IEA de que, com crise ou sem crise, a demanda dos países asiáticos por energia em 2030 tende igualar-se ao consumo dos principais países do “primeiro mundo”.

A edição de 2006 previa que a China ultrapassaria o consumo americano em 2026/2030; na edição de 2007 era 2021/2024; em 2008 o numero foi 2016/2020; no corrente ano a EIA está prevendo que a China já ultrapassará o consumo americano entre 2010 e 2014!

A conseqüência inelutável disso reflete-se no aviso dado pela Arábia Saudita de que dentro dos próximos 2 ou 3 anos os preços do petróleo estarão em nivel igual ou maior do que o pico alcançado em 2008.

As curvas abaixo foram feitas a partir dos dados obtidos dos relatórios da EIA, da IEA, e da OPEP datados de junho/2009.

A linha vermelha mostra a produção total de "líquidos", que inclue, além do petróleo crú, os liquidos condensados do gás, o NGL, os biocombustíveis, os "ganhos de refinaria" e os combustíveis sintéticos. A linha negra mostra a estimativa de demanda. Em MBD milhões de barris por dia, indicados no eixo da esquerda.
A linha verde pontilhada mostra a media ponderada dos preços em US$ por barril, extrapolada a partir de 2009.
Clique na Imagem para ampliar

Uma situação totalmente adversa para a recuperação da economia mundial, dentro da qual um dos poucos vencedores poderá ser o Brasil que, além dos bio-combustíveis, terá o benefício da produção dos grandes campos ultra-profundos da camada pré-sal.

segunda-feira, 30 de março de 2009

O G-20 e a inadministrabilidade da Crise

Basta inspecionar o último relatório sobre a situação dos “papeis derivativos”, emitido pelo escritório de controle da moeda dos Estados Unidos (Quarterly Report on Bank Trading and Derivatives Activity), para que fique bem clara, aos olhos de quem quer ver, que o tamanho da crise está muito acima do que seria possível controlar, e que as supostas soluções que vem sendo propostas a nivel de governos, e reuniões internacionais, como a do G-20, em abril, não passam de tentativas de esconder um desastre de proporções inacreditáveis.

Nesse relatório pode-se verificar que o conjunto dos 5 maiores bancos é detentor hoje de 96% das posições dos derivativos dos bancos americanos, os quais são, em ordem de comprometimento decrescente:

JPMorgan Chase, que detém espantosos 88 trilhões (88 mil bilhões !!) de dólares, em derivativos; seguido pelo Bank of America com 38 trilhões em derivativos; pelo Citibank com 32 trilhões; e pelo Goldman Sachs, com 30 trilhões.

Em quinto lugar vem o resultado da fusão Wells Fargo-Wachovia Bank, com “meros” 5 trilhões em derivativos. O sexto da lista seria o ramo americano do HSBC, com 3,7 trilhões.

Os tão falados 180 bilhões utilizados para evitar a falência da AIG foram principalmente empregados para pagar o seguro de derivatives de Goldman Sachs, Citibank, JP Morgan Chase, Bank of América e outros, que se revelaram sem valor.

Não dá para entender como os “especialistas” que estão tratando do assunto querem que acreditemos que despejar mais algumas centenas de bilhões de dólares possa mudar a situação de um universo de centenas de trilhões, em que garantias de papel representam ativos inexistentes, numa escala 10 (dez) vezes superior ao total anual da produção mundial.

Vai ficando cada vez mais claro aos olhos do mundo que despejar moeda-papel nesse saco sem fundo é o mesmo que fornecer a um alcoólico acesso ilimitado ao barril de cachaça, e ao falsário a chave da impressora -- o que interessa principalmente a esses bancos, e ao governo americano.

Na China, na Rússia e na Europa, isso já foi entendido.

Mas o Brasil vai ao G-20 à reboque dos americanos, e com Lula apaixonado pela ginga do Obama.

O que, diga-se de passagem, não vai fazer a menor diferença, porque a única coisa que se pode esperar de uma reunião desse tipo, é a exacerbação das divergências.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

A verdadeira causa da crise financeira

A raiz da questão:A presente crise está sendo apresentada como um problema técnico causado pelo excesso de facilidades na contratação de hipotecas, e empréstimos feitos sem adequadas garantias, que pode ser tecnicamente resolvido pela aplicação de providências adequadas, como baixar ou elevar taxas de juros, ou injetar recursos públicos para a salvação de bancos insolventes.

Na verdade a situação é extremamente mais grave do que isso, porque tudo indica que a semi-esquecida crise energética detonou um processo sem volta de desmoronamento do sistema financeiro mundial, baseado na criação moeda lastreada exclusivamente em papel, e num mecanismo de endividamento crescente, que pressupõe a ilimitada expansão da economia.


O mecanismo de criação da moeda

Antes de mais nada é fundamental entender porque o sistema de criação dos meios de pagamento pelos Bancos Centrais funciona como uma “corrente de cartas” ou “pirâmide financeira”, indistinguível das perseguidas pela polícia quando montadas por vigaristas ambiciosos.

O procedimento é bem semelhante, em todos paises que operam com Bancos Centrais. Digamos que, no Brasil, se pretenda expandir a base monetária em 10 bilhões de reais:

1) Com esse objetivo, o Tesouro Nacional imprime (ou promete imprimir) uma certa quantidade de papéis lindamente impressos, no valor nominal de 10 bilhões de reais, e os entrega ao Banco Central, que em troca deposita nas contas do Governo, no Sistema de Bancário Nacional, 10 bilhões de reais, que passam a integrar os meios de pagamento. Esse depósito pode ser feito em Notas de moeda corrente, também lindamente impressas, ou ser simplesmente realizado por via eletrônica.
2) Nesse ato o Governo passa a ser devedor não só do total depositado, mas também dos juros correspondentes às Letras do Tesouro adquiridas pelo Banco Central.
3) A legislação em vigor determina que os bancos que fazem parte do Sistema Bancário estão autorizados a emprestar ao público uma elevada fração, normalmente 90%, dos depósitos neles feitos. Sendo assim, eles podem, logo de inicio, emprestar -- e efetivamente o fazem, pois seus lucros provém disso – 9 bilhões de reais.
4) Desse momento em diante ocorre uma coisa inacreditável, que se assemelha ao “milagre da multiplicação dos pães e peixes”: os 9 bilhões de reais se transformam, em operações sucessivas, em 90 bilhões de reais emprestados ao publico usando “moeda escritural” -- que é um nome impressionante aplicado a um dinheiro que os bancos emprestam sem ter, simplesmente criado “do ar”.
5) A mecânica disso é ridiculamente simples:
a) Quando os bancos emprestam os primeiros 9 bilhões a seus clientes, eles fazem isso simplesmente dando entrada num crédito escritural na conta de cada um deles, totalizando 9 bilhões de reais.
b) Se esses recursos são movimentados ou não, pouco importa, os saques feitos em cheque ou moeda voltam sempre como depósitos, ao mesmo banco, ou em outro, do Sistema Bancário. Os 9 bilhões emprestados constituem assim, para todos fins legais, depósitos distintos que dão aos bancos direito de emprestar 90% desse valor – ou seja, mais 8,1 bilhões.
c) Esses novos empréstimos ao serem creditados (“depositados”) nas contas dos clientes geram o direito de emprestar mais 90% de 8,1 = 7,29, e assim por diante, um número infinito de vezes.
d) O total emprestado, portanto é
9 + 0,9 x 9 + (0,9 x 0,9) x 9 + (0,9 x 0,9 x 0,9) x 9 + (0,9 x 0,9 x 0,9 x 0,9) x 9 + .....
Os que fizeram o ginásio no tempo em que se aprendia alguma coisa já perceberam que trata-se da soma dos termos de uma progressão geométrica decrescente, infinita, cujo termo inicial a1= 9 e a razão q = 0,9.

A fórmula que fornece o resultado é
S = a1 / (1- q) = 9 / (1-0,9) = 9 / 0,1 = 90;

90 bilhões !!

6) Em suma, cada 1.000 reais em moeda criada pelo Banco Central gera 10.000 reais de dívidas sendo 9.000 em dinheiro criado “do ar” pelos bancos, para os bancos, sem contar as taxas e juros.

A respeito desse fato me vem á lembrança as palavras de um conhecido meu, que depois de ganhar muito dinheiro como incorporador e virar financista e banqueiro, comentou certa vez:

“É incrível como é fácil criar dinheiro. Basta anotar um crédito na conta de alguém que ele sai assinando cheques. E o melhor é que ele me paga de volta esse dinheiro que não dei. Se eu tivesse sabido disso antes, não teria perdido tanto tempo tentando ganhar dinheiro de outro modo”.
Porque o sistema está fadado a implodirO que determina a instabilidade fundamental do Sistema não é o dinheiro fácil ganho pelos banqueiros, é o fato de que os 90 bilhões de reais de dinheiro novo criado por eles tem efeito inflacionário, adquirindo valor pela via da desvalorização do conjunto da base monetária.

Além disso, toda essa bolada de dinheiro – isto é, os 10 bilhões iniciais criados pelo Banco Central e os 90 bilhões criados pelos bancos, tem que ser pagos com o acréscimo de juros, digamos 12%, ou 12 bilhões de reais, isto é, a quantidade de dinheiro que é devida aos bancos será sempre maior que a quantidade de dinheiro (moeda corrente + depósitos bancários) existente em circulação.

Isto quer simplesmente dizer que um Sistema Financeiro operando dessa forma baseia-se na obrigação de pagar juros com um dinheiro que não existe -- nem existirá, caso não se providencie a expansão da base. O que gera a necessidade da expansão permanente da economia para torna-la capaz de contrabalançar o volume de dinheiro ciclicamente criado -- condição sine qua non da preservação do Sistema.

Em suma, do mesmo modo que na “pirâmide financeira” ou na “corrente de cartas”, que fica cada vez mais difícil de ser mantida porque exige um volume cada vez maior de dinheiro, um Sistema Financeiro baseado na dívida fatalmente entra em processo de quebra, desabamento, derretimento (palavras que começam a ser ouvidas, ultimamente) quando atinge o ponto em que se torna impossível conseguir participantes capazes de manter a roda girando com a velocidade suficiente.

Desde 2001 a economia americana começou a emperrar, exigindo juros mais baixos e facilidades cada vez maiores para encontrar tomadores de empréstimo nas proporções necessárias.

A partir de 2005, o começo de recessão causada pelos altos custos de energia, fez com que as pessoas tivessem menos dinheiro para consumir ou pagar dividas.

Para que um sistema financeiro funcione é fundamental que os tomadores de empréstimos paguem suas dívidas. O aumento da inadimplência desaqueceu a maior economia do planeta e contaminou os parceiros globais que haviam investido trilhões de dólares no mercado de papéis derivativos, garantidos por duvidosas hipotecas e outros títulos afins

Instalou-se assim a crise sistêmica global:

1) os bancos estão insolventes porque seus empréstimos estão garantidos por ativos sem valor; 2) a recessão econômica interrompeu o crescimento ininterrupto que viabiliza o sistema baseado na dívida; 3) não há como estimular a economia inundando os bancos com dinheiro que o público hesita em tomar, e que os bancos receiam emprestar, porque não confiam nos tomadores.

Para todos os efeitos o sistema quebrou. A única coisa que está mantendo a estrutura colada é a enorme fé no poder do Estado, e a visão desenvolvimentista de que déficits não tem muita importância, associada aos economistas da chamada “Escola de Chicago”.

Outros cansaram de pregar no deserto a verdadeira verdade que um sistema como esse, baseado no aumento da dívida pública e privada, levará fatalmente à insolvência dos devedores, ao desaparecimento da base financeira, e à desintegração do Sistema Financeiro Internacional.

Resta aguardar o desfecho, para ver quem tem razão.